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  • Mariângela Zambon

UNIÃO ESTÁVEL E HERANÇA


A legislação atual prevê um tratamento diferente ao cônjuge no casamento e ao companheiro na união estável na sucessão, por morte do cônjuge ou do companheiro. A sucessão no casamento está prevista no artigo 1.829 do Código Civil, enquanto que para a União estável a previsão encontra-se no artigo 1.790 do Código Civil.

A principal divergência é que, no casamento, não havendo descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente recebe a totalidade da herança, isto é, não há concorrência com outros parentes; enquanto que, na união estável, não havendo descendentes do falecido, o companheiro sobrevivente concorre com os ascendentes (pais, avós...), ou colaterais até o 4º. grau (irmãos, tios, sobrinhos, primos), recebendo apenas um terço da herança, e somente na ausência de ascendentes ou colaterais até o 4º. grau, o companheiro recebe a totalidade da herança.

Sobre esta diferença de tratamento, em relação à constitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que rege a sucessão do companheiro na união estável, encontra-se em julgamento, no Supremo Tribunal Federal, o Recurso Extraordinário - RE 878694, que busca igualdade de tratamento na sucessão do companheiro em união estável, em comparação com o cônjuge no casamento. Veja o caso concreto abaixo, em julgamento no STF.

Caso Concreto

No caso concreto, que está em julgamento no STF, a recorrente vivia em união estável, em regime de comunhão parcial de bens, por volta de nove anos com seu companheiro, quando este veio a falecer, sem deixar testamento. O companheiro falecido não possuía descendentes nem ascendentes, somente três irmãos.

A decisão de primeira instância reconheceu ser a companheira herdeira universal dos bens do casal, atribuindo ao instituto da união estável igual tratamento que é dispensado ao casamento na sucessão, com fundamento no artigo 1.829 do Código Civil.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou a decisão de primeira instância, com fundamento no inciso III do artigo 1.790 do Código Civil, e limitou o direito sucessório da recorrente a um terço dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável, ficando o restante com os irmãos do falecido, também os bens particulares do falecido seriam recebidos somente pelos irmãos. Vale salientar que, se a recorrente fosse casada com o falecido, ao invés de manter uma relação de união estável, faria jus à totalidade da herança.

A defesa da recorrente interpôs Recurso Extraordinário ao STF, contestando a decisão do Tribunal de Justiça de MG, com a alegação de que a Constituição Federal garante o mesmo tratamento às famílias constituídas por união estável e pelo casamento, e que qualquer forma de constituição familiar, tem a mesma proteção e garantia do Estado.

Em Julgamento no STF - RE 878694

O julgamento do Recurso Extraordinário - RE 878694, relativo ao caso acima, encontra-se suspenso no Supremo Tribunal Federal desde 31/8/16, por pedido de vista do Ministro Dias Toffoli, e debate a constitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, quanto ao tratamento diferenciado e prejudicial ao companheiro em união estável, em matéria de sucessão.

O Recurso visa reverter a decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que com fundamento no inciso III do artigo 1.790 do Código Civil, determinou a concorrência da companheira sobrevivente com os três irmãos do falecido.

O Relator do caso, Ministro Luís Roberto Barroso do STF, entendeu ser inconstitucional o tratamento diferenciado na sucessão do cônjuge e do companheiro, e entende que a previsão do artigo 1.829 do Código Civil deve ser aplicada, tanto na sucessão dos cônjuges no casamento quanto na sucessão dos companheiros em união estável. Segundo o Relator “no sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no artigo 1.829 do Código Civil de 2002”.

Para o Ministro, a Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima, incluindo-se nesse rol as famílias formadas pelo casamento e as famílias formadas pela união estável. Salienta que não será legítimo diferenciar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, essa diferenciação entre as entidades familiares não é compatível com a Constituição, segundo ele.

Propôs o Relator que o artigo 1.829 CC tenha sua interpretação alterada, e contemple também o companheiro, onde consta ‘cônjuge’, no texto da lei, deve ser lido também companheiro em união estável. Segundo ele, “O artigo 1790 do Código Civil discrimina o companheiro, atribuindo-lhe, na sucessão, direitos inferiores aos direitos que são reconhecidos ao cônjuge no casamento, ferindo os princípios da igualdade, da dignidade da pessoa humana”.

O voto do Relator e da maioria dos Ministros presentes, somando sete votos, foi pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, e pelo entendimento de que não deve haver distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, e que na sucessão de ambos, deverá ser aplicado o artigo 1.829 do Código Civil. Além do Relator Ministro Luís Roberto Barroso, votaram os Ministros Luiz Edson Fachin, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Celso de Mello e Carmen Lúcia.

O julgamento foi suspenso por pedido de vista do Ministro Dias Toffoli. Dos onze Ministros que compõe o Supremo Tribunal Federal, sete já se manifestaram pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, a tendência é de que essa tese permaneça até o final da votação, mas nada impede que haja alteração nos votos já proferidos, até o final do julgamento.

Muitos processos de inventários encontram-se pendentes, aguardando pela finalização desse julgamento no Supremo Tribunal Federal. Espera-se pela retomada da votação, e que seja mantido o entendimento verificado até então, determinando a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, equiparando a união estável ao casamento, em termos de sucessão.

Mariângela Zambon

Advogada

mariangela@zambon.adv.br

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